terça-feira, 4 de setembro de 2012

Dias desiguais

Era uma manhã como qualquer outra. Tinha o mesmo perfume de orvalho no ar, o mesmo som de passarinho cantando, a mesma claridade do sol adentrando as frestas das janelas. Mas algo não soava bem. Ele acordou, sentou-se na beira da cama, por alguns segundo hesitou em espreguiçar-se. Mas o fez. Uma leve dor nas costas o pegou desprevenido, e o obrigou a paralisar seu movimento de braços erguidos. Até que a dor se foi, e ele prosseguiu com seu ritual matutino do despertar.

Seguiu para a cozinha, sem perceber o quão vazia a casa estava, sua mulher havia saído, seus filhos não faziam a costumeira algazarra. Havia realmente algo estranho, que por seus olhos passou despercebido. Seguiram-se alguns minutos de total automatização de atos, da preparação do café ao momento de tomá-lo. Em seguida, o banho que igual a todos os outros durava cerca de 15 minutos sob a água quente que o convidava a permanecer ali, imóvel, tentando compreender o sentido da vida.

Depois do banho, partiu para o trabalho. Seus colegas fitavam-no atentos, como se algo nele os tivesse despertado interesse repentino, talvez uma mancha na camisa - pensou - ou as olheiras que insistiam - a noite não havia sido bem dormida. Mas passou o dia todo assim, sem tentar saber, sem querer saber. Foi um dia como qualquer outro, embora algo ainda estivesse estranho.

Depois do expediente, voltou para casa, e ainda não viu sua família. Até os cachorros que o recebiam aos pulos, ali não estavam. Nesse momento, ele começou a estranhar a si mesmo e a sua casa. Pensou: “Teria eu me esquecido de algo, seria o caso de telefonar à esposa, ao padre, à polícia?” Alguns segundos se perdeu em divagações, mas estava cansado demais. Deitado no sofá, adormeceu.

No dia seguinte, acordou. E para sua surpresa, estava de volta à cama, sua esposa ali deitada e seus filhos gargalhando na cozinha o apaziguaram. Fora apenas um sonho estranho. Dessa vez, ele havia acordado realmente, embora estivesse pensando: “Dessa vez é real, estou sonhando novamente ou estaria sonhando pela primeira vez?” Bem, isso ele descobriria mais tarde, quando dormisse novamente, e acordasse em algum lugar o qual não sabia ao certo.

Mas uma coisa era certa: estava aliviado em ter a esposa amada, a quem abraçou por longos minutos, ali ao lado. E mais aliviado em beijar seus filhos, brincar com seus cachorros, ter um dia normal no trabalho, e dormir novamente, como criança depois de um longo dia no parque de diversões. E assim foi, dormiu em paz. Na manhã seguinte, acordou, no sofá, sem a esposa, os filhos, os cachorros. Novamente, sem sentido...

Guilherme Ferreira Aniceto

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