Seguiu
para a cozinha, sem perceber o quão vazia a casa estava, sua mulher
havia saído, seus filhos não faziam a costumeira algazarra. Havia
realmente algo estranho, que por seus olhos passou despercebido.
Seguiram-se alguns minutos de total automatização de atos, da preparação
do café ao momento de tomá-lo. Em seguida, o banho que igual a todos os
outros durava cerca de 15 minutos sob a água quente que o convidava a
permanecer ali, imóvel, tentando compreender o sentido da vida.
Depois
do banho, partiu para o trabalho. Seus colegas fitavam-no atentos, como
se algo nele os tivesse despertado interesse repentino, talvez uma
mancha na camisa - pensou - ou as olheiras que insistiam - a noite não
havia sido bem dormida. Mas passou o dia todo assim, sem tentar saber,
sem querer saber. Foi um dia como qualquer outro, embora algo ainda
estivesse estranho.
Depois
do expediente, voltou para casa, e ainda não viu sua família. Até os
cachorros que o recebiam aos pulos, ali não estavam. Nesse momento, ele
começou a estranhar a si mesmo e a sua casa. Pensou: “Teria eu me
esquecido de algo, seria o caso de telefonar à esposa, ao padre, à
polícia?” Alguns segundos se perdeu em divagações, mas estava cansado
demais. Deitado no sofá, adormeceu.
No
dia seguinte, acordou. E para sua surpresa, estava de volta à cama, sua
esposa ali deitada e seus filhos gargalhando na cozinha o apaziguaram.
Fora apenas um sonho estranho. Dessa vez, ele havia acordado realmente,
embora estivesse pensando: “Dessa vez é real, estou sonhando novamente
ou estaria sonhando pela primeira vez?” Bem, isso ele descobriria mais
tarde, quando dormisse novamente, e acordasse em algum lugar o qual não
sabia ao certo.
Mas uma coisa era certa: estava aliviado em ter a esposa amada, a quem
abraçou por longos minutos, ali ao lado. E mais aliviado em beijar seus
filhos, brincar com seus cachorros, ter um dia normal no trabalho, e
dormir novamente, como criança depois de um longo dia no parque de
diversões. E assim foi, dormiu em paz. Na manhã seguinte, acordou, no
sofá, sem a esposa, os filhos, os cachorros. Novamente, sem sentido...
Guilherme Ferreira Aniceto
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